Foram muitos rótulos, muitos sabores, descobertas incríveis, uma viagem maravilhosa por antigos e novos caminhos. Beber um vinho desconhecido é como ser apresentado a alguém, conhecer um prédio histórico, uma cidade, um país… Você não sabe o que o espera, que surpresas você terá e o resultado do momento.

Por outro lado, um vinho conhecido, bebido em uma circunstância totalmente nova e inusitada, além de matar saudade de um velho amigo, lhe traz novas experiências e demonstra o quanto essa bebida incrível é versátil e tem sempre algo para dizer.

Nossa visita à Europa rendeu 41 vinhos nos 18 dias em que estivemos por lá, e há mais números incríveis no infográfico que publicamos. Isso só foi possível por conta dos ótimos wine bars que visitamos, onde pudemos degustar os vinhos em taças de 100 ml e 150 ml. Houve noites em que tomamos seis vinhos diferentes! (três taças cada um, deixando bem claro!)

No total, foram oito visitas a sete wine bars diferentes, três em Portugal e quatro em Berlim. Os de Berlim você encontra nesse post. Já em Portugal, não tivemos como evitar repetir um de Lisboa, que tinha simplesmente 650 rótulos diferentes à disposição! TODOS PORTUGUESES!

Curtir Portugal, descobrindo Lisboa

Chiado, LisboaPortugal foi realmente uma etapa muito diferente de nossa viagem. Estávamos em um dos maiores produtores de vinho do mundo e em Lisboa, uma capital cultural, linda, interessante. Impossível não se apaixonar por essa cidade.

Há algum tempo eu venho elogiando o grande momento português, tanto pela qualidade de seus vinhos, quanto pelo excelente custo. E apesar de seu tamanho, cerca de 92.000 km² (Santa Catarina tem 95.000 km²), Portugal produz três vezes mais vinhos que o Brasil.

Em nossa primeira noite fomos passear no Chiado, um charmoso emaranhado de ruas estreitas, muitas sem calçada, onde os restaurantes colocam mesas para fora e os clientes podem apreciar a saborosa culinária portuguesa acompanhada de um bom vinho.

Foi dificílimo escolher, mas no final prevaleceu um fator determinante: quantos bares vocês conhecem que tem 650 rótulos diferentes disponíveis para beber em taça? E ainda acompanhados por uma comida deliciosa? Pois é, esse lugar chama-se Grapes & Bites.

 

Todas as regiões de Portugal em um único bar

Emanuel no Grapes & Bites, Lisboa

Lotado, mas sem espera, mesas próximas, gente rindo e vinhos à volta toda. Fomos acomodados em uma pequena mesa e a Renata pôde fazer uma foto minha com uma parede de rótulos fantásticos atrás. Mandou para a família dizendo que eu estava no meu “parque de diversões”. E estava mesmo!

Alheira do Grapes & Bites, LisboaUm garçom simpaticíssimo apareceu e começamos a conversar sobre vinhos. Com tantos rótulos diferentes, não teve outro jeito: explicamos o que gostávamos, a faixa de preço que queríamos pagar e aguardamos a surpresa. Tínhamos apenas uma exigência para tornar a experiência mais interessante: seriam sempre dois vinhos diferentes por rodada, um para cada um, de modo que provaríamos a maior quantidade possível.

 

Polvo grelhado do Grapes & Bites, LisboaAs taças eram de 150 ml e o saldo da noite foram seis rótulos diferentes! Isso dá pouco mais de uma garrafa. Foi sensacional.

Para acompanhar, uma porção de queijos típicos, muito diferentes do que estamos acostumados, e depois pratos deliciosos. A Renata foi de alheira, uma espécie de embutido, típico de Portugal, delicioso (aliás ela comeu muito isso lá, lembrava dos seus tempos de criança, quando a avó preparava). Eu experimentei um dos melhores polvos grelhados que comi na vida. Maravilhoso, macio por dentro, levemente crocante por fora, muito bem temperado.

Os vinhos foram uma atração à parte. Como já comentei antes, pedimos em taça um total de seis rótulos distintos, de estilos diferentes. Infelizmente um deles não registramos, quando notamos a garrafa já tinha sido levada e não foi possível recuperá-la. Mas vamos falar um pouco sobre esses grandes vinhos.

Quinta do Roriz Reserva 2006 Douro DOCA Renata começou com um Quinta do Roriz Reserva 2006 Douro DOC e eu com o Júlio Bastos Dona Maria Grande Reserva 2010.

Já entrando no clima descontraído do bar, quando o garçom me serviu o vinho acabou e minha taça ficou menor que a da Renata. Brinquei falando que merecia um desconto e este foi prontamente concedido. Rimos muito.

Meu vinho é um clássico. Descobri depois que tinha 94 pontos de Robert Parker! Produzido a partir das uvas Alicante Bouschet (50%), Petit Verdot e Syrah, é brilhante, denso e aromático. No paladar é elegante e redondo, enche a boca e é muito persistente. Impossível passar em branco.

O da Renata tinha uma presença de madeira no ponto certo que o diferenciava. Produzido a partir de três uvas – Touriga Nacional, Touriga Franca e Tinta Roriz – estava em forma excepcional. Marcante, mas redondo, denso na cor e no sabor. Aromas complexos com toque de ameixas. A vinícola informa que esta safra foi muito boa. Cheguei a reclamar que o dela era melhor, rimos e bebemos alternando os copos.

Júlia Kemper Touriga Nacional 2011 Dão DOP e Quinta de Cidrô 2007 Cabernet Touriga NacionalDando sequência, foi a vez de um Júlia Kemper Touriga Nacional 2011 Dão DOP para a Renata e de um Quinta de Cidrô 2007 Cabernet Touriga Nacional para mim.

Imaginem que vocês começaram bem e continuaram melhor ainda. Com 650 rótulos disponíveis realmente é difícil não beber algo muito bom. E foi isso o que aconteceu.

O vinho da Rê era simplesmente incrível. Um varietal com todas as características da casta. Uma cor chamativa na taça, aromas de frutas vermelhas e fundo de café. No paladar, taninos elegantes, um vinho redondo, que dá vontade de beber muito mais.

O meu era algo que me fez parar de comer e refletir a respeito. Escuro, denso, aromas muito complexos, diferentes, combinando frutas negras, baunilha, madeira. Acredito que cada pessoa diria algo diferente a respeito. Na boca é encorpado, sem ser pesado, demonstrando o seu estágio de 18 meses em barricas.

Queríamos mais, mas aí surgiu um problema: eles são obrigados a fechar à meia-noite, sob pena de multa. Ficamos tristes e, quando tudo parecia perdido, o garçom pergunta para o gerente: “posso levá-los lá pra cima?”. Ficamos curiosos. O gerente aprovou e ele tomou as garrafas, o que restava dos nossos queijos, pães, e pediu que o acompanhasse. Nós levamos as taças.

Lapa dos Gaivões João M. Barbosa 2011Ao lado havia um hostel que pertencia ao restaurante. Entramos. Uma construção antiga, mas em bom estado. Subimos uma escada de madeira e, ao atravessar uma porta, nos vimos em uma espécie de “varanda”, com bancos e mesa de madeira rústica, almofadas, plantas e o céu aberto para coroar.

 

 

 

João Maria Barbosa

João Maria Barbosa

Foi nesse cenário que partimos para a última dupla. O meu vinho foi o Lapa dos Gaivões João M. Barbosa 2011 e nesse momento uma revelação nos deixou perplexos: estava diante de nós simplesmente João Maria Barbosa. Sim, nosso garçom era filho do dono da quinta e o vinho que íamos beber tinha sido literalmente feito por ele.

Perguntamos o que ele estava fazendo ali, trabalhando como garçom, e ele respondeu que deseja ser chef e, portanto, trabalha no Grapes & Bites para aprender o ofício. O site da vinícola informa exatamente isso a respeito dele, completando dizendo que ele pega pesado na época da vindima, entre agosto e outubro. Um exemplo de humildade.

Em tempo: o vinho era excelente!

Terraço do Grapes & Bites, Lisboa

Quinta da Ponte Pedrinha Vinhas Velhas 2007Mas foi enquanto nos distraímos com a história que ele se retirou com as garrafas e, quando nos demos conta, não tínhamos registrado o vinho da Renata. E é claro que, sem a foto, é impossível lembrar depois de tomarmos 41 vinhos durante a viagem! Uma pena, mas a experiência como um todo valeu a noite.

Dois dias depois retornamos ao mesmo wine bar. Havíamos estado em outro antes, o By the Wine (leia mais abaixo), tomamos dois bons vinhos, mas estava tão cheio que não havia sido possível comer por lá e, portanto, nos mudamos.

Nessa segunda visita nosso interesse era jantar acompanhado de vinhos diferentes e, portanto, fomos direto para o prato principal. A Renata optou por um prato com pequenos pimentões recheados de queijo e eu pedi bacalhau grelhado acompanhado de batatas. Os pratos estavam deliciosos.

Desta vez experimentamos quatro vinhos. A primeira dupla foi composta pelo Quinta da Ponte Pedrinha Vinhas Velhas 2007 e pelo Quinta dos Carvalhais Colheita 2012.

 

Quinta dos Carvalhais Colheita 2012

O Quinta da Ponte Pedrinha é um daqueles vinhos de cor profunda, rubi, aromas florais, sem ser frutado. Afinal, estamos falando de um vinho de nove anos. Na boca, é um vinho estruturado, encorpado e volumoso, persistente.

Já o Quinta dos Carvalhais, mais jovem, apresenta uma cor muito viva, aromas de frutas vermelhas e uma clara vocação para evoluir. É um vinho elegante com uma acidez bem interessante e final persistente.

Quinta do Mouro Cabernet Sauvignon Estremoz 2011Os dois últimos vinhos realmente fecharam com chave de ouro nossa estada em Lisboa, pois foram realmente dois grandes vinhos. Daqueles que marcam presença e deixam a gente com vontade de provar de novo!

Quinta do Mouro Cabernet Sauvignon Estremoz 2011 é muito potente, denso, um excelente Cabernet Sauvignon. Dono de uma elegância extraordinária para seu estilo, é um ótimo exemplo de como essa uva emblemática se adaptou bem ao Alentejo.

O outro é um ícone. O Quinta Vale D. Maria Vinha da Francisca 2011 é um vinho reconhecido pelos críticos. Recebeu 92 pontos de Robert Parker e 94 da Wine Spectator. Não é qualquer vinho que atinge essas marcas.

É feito a partir das castas portuguesas Tinta Francisca, Touriga Franca, Sousão, Rufete e Touriga Nacional. Bonito na taça, aromático, marcante no paladar. É um vinho português por excelência que merece ser tomado e apreciado bem devagar.

Quinta Vale D. Maria Vinha da Francisca 2011

Um wine bar de um único produtor

BSE – Branco Seco Especial – 2014Na nossa segunda noite em Lisboa fizemos algo diferente. Fomos conferir a indicação do filho da Renata, que tinha morado na cidade, a respeito de um wine bar muito moderno, bonito e com excelentes vinhos, claro. Era o By the Wine, que tem como característica mais interessante o fato de servir apenas vinhos José Maria da Fonseca. São mais de 70 rótulos, entre brancos, tintos e rosés.

A decoração é descolada, o teto é forrado por garrafas e a iluminação dá um aspecto futurista para o ambiente. Nos fundos, fotos, equipamentos antigos utilizados na produção dos vinhos, barricas pintadas de preto com a logo do produtor e música ao vivo compõem um ambiente jovem e descontraído.

O bar estava lotado, estávamos sem reserva, mas conseguimos um lugar no balcão, onde fomos recepcionados por uma simpática garçonete. Analisamos o cardápio e encontramos uma belíssima coleção de petiscos. Entre eles algo que adoramos: ostras frescas.

Antes de chegarem, fomos servidos com um cesto de pães, azeitonas, dois tipos de azeite e um molhinho de pimentão. Aliás, em Portugal comer pão com um bom azeite é quase uma obrigação.

Quinta da Camarate 2015Para acompanhar, seguimos nossa regra de pedirmos vinhos diferentes e compará-los. Com as ostras, naturalmente foram dois brancos.

O meu foi um Quinta de Camarate 2015, o da Renata um BSE – Branco Seco Especial – 2014. Ambos límpidos e brilhantes. O meu um tanto mais frutado e até adocicado, mas muito aromático, persistente e interessante. O da Renata um pouco mais seco e intenso. Ficamos brincando de trocar as taças, saboreando as ostras, que estavam deliciosas.

 

Uma descoberta em Aveiro

Chegamos tarde em Aveiro, cansados de uma viagem de carro que saiu de Lisboa com paradas em Óbidos, Peniche e Fátima. Fomos avisados pelo hotel que os restaurantes fecham às dez da noite, mesmo na zona turística. Esses fatores fizeram com que optássemos por um pequeno wine bar próximo ao hotel para comer algo. Descobrimos depois que nossa decisão se mostraria a mais acertada de todas.

Quinta Nova Nossa Senhora do Carmo 2013Era uma porta pequena, com uma placa com os dizeres Giz Food & Drinks. Entramos e nos deparamos com um ambiente cheio de gente jovem, simpática, bebendo vinho e curtindo a noite. Ficamos bem animados.

Após uma rápida espera, surgiu a nossa mesa e fomos logo pedindo a indicação de um vinho. A escolha foi o Quinta Nova Nossa Senhora do Carmo 2013. Um vinho feito a partir de quatro castas portuguesas – Touriga Nacional, Touriga Franca, Tinta Roriz e Tinta Cão –, que não passa por barrica de carvalho. É um vinho jovem, moderno, ótimo para um wine bar e para acompanhar petiscos ou até um jantar, que foi o nosso caso. Foi nesse dia que a Renata afirma ter comido a melhor alheira da viagem: tostadinha por fora, e cremosa por dentro, do jeito que a avó dela fazia.

Foram grandes momentos que deixaram sua marca, tornaram a nossa viagem ainda mais especial. Impossível não parar para pensar na diversidade, qualidade e custo dos produtos. Alguns vinhos apresentavam apenas 10% do valor que pagamos no Brasil. É muita diferença.

Se alguém hoje me perguntar que país da Europa poderia visitar, com segurança eu responderei Portugal. Se há algum tempo já venho declarando meu amor pelo país e seus vinhos, agora estou ainda mais convencido de que eles vivem um grande momento.

 

Serviço:

Grapes & Bites

Rua do Norte, n81 R/C, 1200-284
Bairro Alto, Lisboa
Telefone: +351 91 936 1171
E-mail: [email protected]

By the Wine

Rua das Flores 41-43
1200-193 Lisboa
Telefone: +351 21 342 0319
E-mail: [email protected]

Giz Food & Drinks

Rua Engº Von Haff 34
3800-176 Aveiro
Telefone: 234 041 407
E-mail: [email protected]

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