O convite da SBAV não havia chamado muito a nossa atenção. Degustação de vinhos brasileiros do Estado de São Paulo? Guaspari? Nunca tínhamos ouvido falar nessa vinícola. Mas um amigo meu, grande conhecedor de vinhos e vice presidente da SBAV, fez um post no Facebook dizendo: “quem puder, participe, vale a pena”. Resolvemos arriscar. E nos surpreendemos. Muito. Muitíssimo, podemos dizer.

Vinhedos da GuaspariA vinícola é nova. Os primeiros vinhedos foram plantados em 2006, com mudas trazidas da França, e ocuparam seis hectares. Dois anos após o primeiro plantio, a vinícola foi construída, a partir de um antigo celeiro de café. O primeiro vinho foi produzido em 2008, de maneira artesanal – apenas 30 garrafas. A primeira safra comercial foi lançada somente em 2014.

A família, que trabalhava com mineração e, portanto, conhece muito sobre solos, descobriu em Espírito Santo do Pinhal, no interior de São Paulo, um terroir muito parecido à região de Bordeaux, na França. Ali se plantava café e, por tradição, onde se planta café também se pode plantar uva. Buscaram então especialistas no mundo todo, decididos a produzir um vinho de excelente qualidade.

Hoje são 50 hectares de vinhedos, divididos em 12 terroirs distintos, onde crescem Syrah e Sauvignon Blanc, com rótulos já disponíveis no mercado; mas há também plantações de Pinot Noir, Cabernet Franc, Cabernet Sauvignon, Merlot, Chardonnay, Viognier e Muskat, que estão nos projetos da vinícola.

Guaspari - Apresentação na SBAVTécnicas diferenciadas

A apresentação na SBAV foi conduzida pela enóloga da Guaspari, Flávia Cavalcanti, que já trabalhou na Herdade do Esporão, em Portugal.

Segundo Flávia, o segredo para a produção de bons vinhos na região é a técnica de dupla poda, desenvolvida pelo pesquisador Murilo Rosa. “Logo depois da colheita, em agosto ou início de setembro, fazemos uma poda de formação. E, em janeiro e fevereiro, fazemos a poda de frutificação. Essa técnica vai me dar os frutos no período de colheita, que é a safra de inverno, em junho, julho e agosto”, explica Flávia. “Isso é para colher as uvas no período mais seco aqui no Estado de São Paulo, que é o inverno. É um controle do ciclo para fugirmos do período chuvoso e conseguirmos produzir no período mais viável para a produção de uva na nossa região, aproveitando todos os fatores climáticos.”

Desde sua fundação, a Guaspari vem fazendo grandes investimentos em tecnologia para desenvolver o setor vitivinícola regional, que era inexistente no local em que está instalada. “Estamos em uma região sem histórico de produção de vinhos, temos de criar nosso próprio banco de dados, tudo é muito novo”, diz Flávia.

A equipe técnica é outro diferencial da vinícola. No campo estão Paulo Macedo, português, e Cristian Sepúlveda, chileno; na enologia, Gustavo Gonzalez, americano que veio da Mondavi, e Flávia Cavalcanti, brasileira que trabalhou em Portugal. “Todo esse time trabalha junto para produzir um vinho da melhor qualidade”, afirma a enóloga.

Os vinhos

Vinícola Guaspari

Segundo Flávia, toda a colheita é manual, com pré-seleção dos cachos, e sempre muito cedo, para colher a uva fresca, evitando a oxidação. “O processo de produção é cuidadoso e os vinhos só vão para o mercado quando consideramos a qualidade excelente”, comenta.

Cada “vista” na propriedade da Guaspari é um terroir diferente. “Os dois Syrahs que comercializamos hoje são de terroirs diferentes e possuem características diferentes, com vinificação independente”, diz Flávia.

Guaspari Sauvignon Blanc 2013Na degustação da SBAV, começamos com o Sauvignon Blanc 2013, produzido no vinhedo Vista do Vale. Durante sua fermentação alcóolica, esse vinho fica parte em tanques de inox e parte em ovos de concreto; 20% dele fica em barricões de 600 litros de carvalho durante 12 meses. Segundo Flávia, essa técnica salienta os aromas, traz mais corpo e estrutura. “O inox salienta o frescor, o ovo a estrutura e o carvalho dá um toque amadeirado”, afirma.

Na taça ele já chama a atenção. Brilhante, claro, límpido, um amarelo palha suave, de cor delicada.

Os aromas mostram se tratar de um vinho diferenciado. Frutas cítricas misturadas com brancas. Há quem falasse em melão durante a degustação. Muito especial.

O paladar é elegante e sobra na boca. Um vinho branco com muita personalidade.

Guaspari Vista do Chá 2012O segundo vinho que provamos foi o Vista do Chá 2012, um Syrah que passa 18 meses em barrica. É um vinho que abre consideravelmente na taça, muito aromático, potente e elegante.

É brilhante e denso, uma característica típica dos Syrahs. Os aromas demonstram claramente sua passagem de 18 meses por barricas de carvalho e convidam para a degustação.

Dos dois Syrahs, este é mais “explosivo” no paladar. Untuoso, enche a boca de sabores. É intenso e persistente.

Guaspari Vista da Serra 2012Para finalizar, outro Syrah da Guaspari: o Vista da Serra 2012, que recebeu medalha de prata no principal concurso de Syrahs do mundo, na França (Syrah du Monde 2015). “Enviamos a amostra para esse concurso com o intuito de receber uma ficha avaliadora no final, e para a nossa surpresa ganhamos uma medalha de prata, concorrendo com 430 rótulos”, conta Flávia.

De semelhança com o Vista do Chá, temos a cor e o brilho, mas para por aí. Este é mais elegante, discreto, mas não passa despercebido. Você também fica com a “boca cheia”, mas nota claramente se tratar de um vinho diferenciado, para ser bebido devagar e apreciado em cada detalhe.

Esse é outro vinho que precisa de um tempo para abrir na taça. Com taninos maduros, redondos, é potente, intenso e persistente no paladar.

O que vem por aí

Hoje a Guaspari comercializa dois tintos varietais Syrah – Vista da Serra e Vista do Chá – um Sauvignon Blanc e um rosé, lançado na primeira semana de fevereiro, que não provamos ainda, pois o evento na SBAV foi no final de janeiro. Segundo Flávia, os próximos lançamentos serão mais um tinto de Syrah, desta vez mais jovem, próprio para o dia a dia; e os projetos de Chardonnay, Viognier e Petit Verdot, que serão lançados futuramente.

“O nosso Cabernet Franc está um espetáculo, mas ele pede pelo menos 24 meses de barrica. Também temos um corte bordalês na vinícola, já engarrafado, esperando o tempo certo de maturação”, adianta.

Como comentamos no início deste post, descobrir a Guaspari foi uma grata surpresa. São vinhos que com certeza continuarão a fazer parte da nossa adega.

Vinícola Guaspari

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